quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Propensão

São tantos mistérios que te envolvem que eu não consigo me conter, a ferocidade para despir-te é tamanha que chega ser cruel. Tenho esse lado traiçoeiro que quer devorar sem demoras o que me atrai. Esse lado afronta minha faceta calma e despretensiosa, apimenta e esquenta toda serenidade. Ao domar meus impulsos, instiguei-me. Uma atração não só tão física, mas astral. A lua negou-se a aparecer na noite em que tu era a caça, não queria ser testemunha de um crime tão carnal. E em meio a tantas bocas, seu sorrir era justamente o que eu queria para mim, fixei-me no brilho e na dimensão. Espreitava-te pelos cantos sem ao menos notar seu olhar. As horas passavam e a ansiedade era corrosiva. Não sairia de lá sem ter, sem me fazer residência. O acaso se envergonhou com notável covardia e agiu. Era o confronto entre dois quereres. Olhares paralisados, sorrisos congelados e intimidação. Rompeu-se o silencio. Despertaram-se urgências. Buscava-me com firmeza a cada evasiva. Envolvíamos em pretensões efêmeras. Não era só o sabor da carne que ansiávamos, mas no fim da noite éramos só dois predadores …

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Vácuo

Foi como se a noite paulatinamente se cansasse de mim e por saturação me implorasse para parar, aliviar o peso dela de carregar todas as minhas expectativas. Quando o sol se põe meu astral muda, meu sorriso brilha e o ar sereno parece diminuir todos os meus bolores. É como se toda noite eu apelasse para o acaso, o convidasse a me surpreender e amanhecesse insultando o sol por aquecer todas as minhas dores. Daí à tarde o ciclo recomeça e me jogo de volta num rio de hipóteses tão desleais comigo. Eu nunca fui de mentir, nem mesmo para mim, principalmente para mim. Eu sempre soube que por mais duro que pudesse ser mergulhar no meu âmago e me atormentar com as minhas realidades era o que, no fim, me salvaria de um deslize qualquer. Porém naquela noite me indispus com a sorte, não poderia mais confiar nela. Meu desejo era singular, cruelmente especifico. Ansiava novamente pelo seu cheiro me despertando de uma distração qualquer, seu jeito tosco de forçar o meu riso só para me ver apertar os olhos e seu abraço firme me roubando arrepios. E queria tão mais, muito mais, com uma urgência que me doía. Mas são nossos subentendidos que nos afastam, meias verdades tão covardes e frases tão bem forjadas para abrandar o fogo que arde. Só não vou mais me enlaçar em ilusões, se as nossas defesas são nossos maiores apreços e são as que mais penamos em deixar, então nos deixemos passar. Até um dia, talvez. Mas eu já não vou mais esperar.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Remate

Não fala nada, só me abraça e me deixa por mais um instante no calor do seu afago. O nosso prazo está esgotando, acabou, antecipei o fim. Ainda que não houvesse motivos, eu quis partir. Quero ir embora antes que o drama manche minhas boas lembranças. Quero recordá-lo assim, com esse sorriso largo e os abraços apertados. Em que parte de mim eu escondo o que faltou pra nós dois? Não quero mais um fantasma sussurrando em meus ouvidos o quanto eu pequei, o quanto eu não soube amar. Permita que a saudade me desperte o arrependimento, mas me deixa fugir. Aceito todo julgamento e tomo pra mim toda a culpa, não por bondade, mas porque sou covarde. Lido melhor com a solitude do que com a falta de domínio. Por mais que eu repita que nunca quis te ferir e não imaginei partir tão cedo, você ri e se arma com ironias. Se sente tão certo ao dizer que eu nunca te quis, não quis investir e queria o mundo e viver só pra mim. Nunca tentei mudar teu modo de pensar, não me esforcei pra dizer o quanto valia cada reencontro. Mas na verdade o que te escondo foram minhas tentativas falhas de lhe tornar naquilo que me faltava. Por favor, não transforme tudo em dor! Despreze-me, odeie-me, mas não me obrigue a lhe negar amor. Não insiste, não dá, meu coração não soube te amar.